PPP custam 80 euros a cada português em 2011

Despesa acumulada com as parcerias público-privadas ascende a 48 mil milhões de euros.Um valor que representa um encargo superior a 4500 euros por cada contribuinte. Só em 2011, a factura será de 79,1 euros por português. Um bebé que tenha nascido no início de 2011 só estará livre dos encargos das PPP quando tiver 72 anos.

Quando 2011 chegar ao fim, cada português terá pago quase 80 euros pelos encargos assumidos pelo Estado com parcerias público-privadas (PPP) contratualizadas desde 1995. Isto porque, de acordo com o Orçamento do Estado, só este ano a factura a pagar por estas parcerias entre a administração pública e o sector privado ascende a 841,9 milhões de euros, entre despesas com concessões rodoviárias, ferroviárias, de saúde e segurança.

O custo individual para alimentar as PPP em 2011 (79,1 euros) aumenta muito se fizermos as contas ao que terá de ser pago às concessionárias destas parcerias ao longo das próximas décadas. Carlos Moreno, juiz jubilado do Tribunal de Contas, concluiu que, até 2050, os custos plurianuais até essa data ascendem a 48 mil milhões de euros. O mesmo que dizer que, no final deste período, cada português terá pago 4512,2 euros para financiar todas as PPP.

De acordo com os dados disponibilizados pela Direcção-Geral do Tesouro e das Finanças, as parcerias vão prolongar-se, pelo menos, até 2083, ano em que expira o contrato de concessão da Barragem Foz Tua, cujos contratos foram assinados em 2008 com a EDP, com a duração de 75 anos. Isto é o mesmo que dizer que, caso não sejam contratualizadas mais PPP, uma criança que tenha nascido no dia 1 de Janeiro deste ano terá 72 anos quando este prazo terminar. Uma altura em que, muito provavelmente, já estará reformada e terá netos.

Actualmente, o Estado português tem 83 PPP - a primeira foi assinada em 1995 com a Lusoponte, para a construção da Ponte Vasco da Gama e para a exploração das portagens nesta travessia e na Ponte 25 de Abril. Destas, 64 encontram-se em exploração e 19 em construção. Entre as parcerias que se encontram em fase de construção, destaque para a polémica construção do troço do TGV entre Poceirão e Caia, cujo contrato foi assinado em 2010, com um período de vigência de 40 anos.

Um instrumento para camuflar o défice

A proliferação de PPP em Portugal ao longo dos últimos anos é explicada pelos especialistas ouvidos pelo DN com o facto de estas parcerias serem utilizadas pelo Estado como uma ferramenta para camuflar as contas do défice público. Uma situação que, segundo Carlos Moreno - que durante quinze anos realizou auditorias a estes contratos entre o Estado e consórcios de empresas privadas -, está relacionada com a moeda única, uma vez que a entrada na Zona Euro obriga os países membros a manter o défice público abaixo dos 3% do Produto Interno Bruto (PIB) e estabelece que a dívida pública não pode exceder 60% do PIB.

"São essas regras de bom aluno da moeda única que empurram os governos para a opção das PPP", explicou ao DN o juiz jubilado, frisando que "os sucessivos governos acabaram por descobrir que pondo os privados a financiar estas obras, para o Orçamento do Estado, para o défice e para a dívida não tinha consequências". Carlos Moreno, que recentemente publicou um livro que aborda esta temática, adianta ainda que será entre 2014 e 2024 que a maior fatia da factura será paga pelo Estado português.

Esta visão é partilhada pelo economista João Cantigas Esteves, professor do ISEG que se tem dedicado ao estudo das despesas públicas e que olha para as PPP como uma situação de "desorçamentação completa em áreas fundamentais do Estado". "Do ponto de vista do OE e das contas públicas, só entra a verba [dos encargos com as PPP] do respectivo ano". O pior, sublinha o economista, "é que este endividamento encapotado, o valor restante da dívida, não aparece em lado nenhum".

Segundo Carlos Moreno, o grande erro dos governantes que assinaram estes contratos foi terem esquecido as regras elementares para justificar a criação de uma PPP: "as boas práticas dizem que só se deve optar pela utilização de PPP em projectos de grande envergadura e com um consenso nacional generalizado".

"Não é isso que se verifica. Houve uma banalização da utilização das PPP", lamenta o antigo juiz do Tribunal de Contas, frisando que hoje se recorre "por tudo e por nada" a este instrumento. "O Estado começou a multiplicar parcerias, mas sem fazer um exercício fundamental, que é comparar aquela solução com a solução tradicional para ver qual ficava mais barata", acusa.

|DN|
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