A Lisboa extraordinária





MANUEL QUEIROZ

Pelos vistos, Lisboa e Oeiras assinaram um acordo de 3.5 milhões de euros sem saber ao certo o que assinavam. Trata-se do famoso acordo com a Red Bull Air Race para levar a corrida dos aviões para as extraordinárias paisagens do Rio Tejo, embora os espectadores só possam apreciar a coisa na televisão ou com uns bons binóculos.

Para se perceber mais uma vez como foi também extraordinária a forma como se levou a prova para a capital, há esta notícia de que o presidente da Câmara, António Costa, não sabe afinal bem como é que vai financiar a prova. Porque afinal os patrocínios são quase todos da Red Bull e as Câmaras só têm que pagar. São 3.5 milhões de euros.

O GRANDE PORTO já tinha dado conta que ninguém sabia bem o que estava a fazer na Câmara da capital, em notícias com que fomos acompanhando o caso - o site da Câmara de Lisboa falava em garantir 50 mil espectadores!

Mas é fantástico como num país em crise se surripia uma prova que decorria com êxito noutro ponto do país sem ter todas as certezas do que se estava a fazer.

Se o contrato está assinado - há fotografias de Costa sentado ao lado de Isaltino Morais a documentar - então que é que se há-de fazer?

Eu tenho uma solução: corta-se qualquer coisa no que se gasta nos coretos de Lisboa, uns pasteis a menos no Mundial de Jovens Pasteleiros que custa 300 mil euros e já se está quase lá. Que é como quem diz, o Casino Lisboa tem boas receitas e paga.

Mas só mesmo em Lisboa, só mesmo na capital, uma cena destas se pode passar. Em que se tratam contratos de milhões sem se ter a certeza do que se anda a fazer e do que está ou vai estar no contrato.

Já tivemos o famoso “Está tudo tratado só falta o dinheiro” do tempo em que havia um presidente do Sporting de bigodes que tinha gostos caros e bolsos baratos. Agora temos o “Está tudo tratado só faltam os patrocínios” da Câmara.

Mas que outra autarquia se poderia dar ao luxo de assinar um contrato desses sem todas as garantias?

É porque Lisboa tem todas as garantias de que paga - se não forem outros, deve ser o Turismo de portugal que é um bom amigo.

É por estas e por outras que o povo não percebe muito bem o que é a crise. É que por um lado sente o desemprego a aumentar dia a dia no aparelho produtivo, enquanto o aparelho improdutivo da capital se entretém com estes extraordinários benefícios de soma negativa para o país - a prova era mais barata quando se desenrolava entre o Porto e Gaia e ainda por cima tinha sucesso.

O país não pode continuar a assistir a que se dissipe riqueza num lado e se ande a mendigar no outro.

Se o Casino de Lisboa dá receitas para tudo e mais alguma coisa, o que isso quer dizer é que as receitas assim obtidas têm que ser repartidas de outra forma. Está tudo dentro da mais estrita legalidade?

Claro, mas as leis mudam-se quando é preciso. Se Lisboa tem mais de um milhão para alindar os seus coretos e Vimioso não tem um limpa-neves, é forçoso que alguém saiba redefinir as prioridades e colocar o dinheiro ao serviço do que é necessário.

|Grande Porto|

Regionalização em “strip” (despida de conversa) (1)


DANIEL PALHARES | Economista |


I - Um princípio constitucional fundamental

A regionalização, entendida como a criação de meras regiões administrativas, é indispensável em Portugal por ser um imperativo da Constituição. O artigo 6º diz que o Estado é unitário, mas deve respeitar, entre outros princípios fundamentais, o da descentralização democrática da administração pública.

II - Consequência do Estado centralizador

Mas a indispensabilidade da Regionalização não resulta só, nem principalmente, da Constituição. Resulta sobretudo do fracasso evidente da acção do Estado Central, fracasso amplamente comprovado pelos péssimos resultados, em desenvolvimento territorial equilibrado, de séculos de administração (monárquica, republicana e de Estado Novo) centralizada em Lisboa

O regime pós-Abril de 1974 continuou, no essencial, a manter ou a arrastar ainda mais para a capital, além da administração pública, a nata da administração do sector privado, tudo o que há de melhor na cultura e no lazer, as possibilidades de sucesso profissional no topo e, consequentemente, as opções de residência dos que aspirem aos patamares superiores da Vida.

III – A Constituição é para esquecer

Em matéria de Regionalização a Constituição contém, no Artº 6º, um princípio excelente: o da descentralização da administração pública. Mas o que foi lá metido sobre regiões administrativas, ou é muito pouco, ou é apenas sofrível, ou é péssimo.

Os artigos 255º a 262º (ou seja, todo o capítulo IV da parte que trata do Poder Local) por um motivo ou outro, devem ser retirados. Estes artigos respeitam à forma da criação legal das regiões, à necessidade de referendo, às atribuições e competências das regiões e aos seus órgãos. Algumas disposições podem, contudo, ser aproveitadas.

IV – Riscos

Existe realmente – e merece toda a cautela – o risco de poder conduzir ao desnecessário aumento da despesa pública e ao alargamento redundante da classe política. Mas não podemos deixar que este perigo, convertido em papão, actue como um factor de adiamento perpétuo.

Se o figurino for sério e a contar com esse risco, ele pode ser minimizado.

V – Quem é contra

É sobretudo nas cúpulas das elites (políticas, económicas, financeiras, culturais e outras) que se concentram aqueles que, ainda hoje, combatem e atrasam a Regionalização Isso entende-se. Essas cúpulas têm o poder na mão, centralizado e próximo. Gostam dele e dele beneficiam. As suas carreiras e interesses estão vitalmente centrados em Lisboa, por onde passa tudo o que é importante. (...) Estas são as posições por mero interesse próprio (...).

Outros há que combatem a Regionalização invocando razões aceitáveis e sectorialmente válidas, no plano intelectual ou no dos afectos. Contudo, na maioria dos casos, é possível sentir, por trás da argumentação, que a situação pessoal convive confortavelmente com o centralismo vigente.

Existem ainda – e merecem todo o respeito – posições contrárias à Regionalização que não cabem nestas caricaturas simplificadas. Mas, infelizmente, elas (as caricaturas) representam o essencial do quadro que é contra.

Parece-me ser evidente que a Regionalização é do interesse da grande maioria dos portugueses, a norte, ao centro e a sul. Mas também parece evidente que não é do interesse das cúpulas dos poderes. (...).

(continua)
|GP|

Regionalização presa à nova liderança do PSD


O secretário de Estado da Administração Local considera que há condições para que a regionalização avance ainda esta legislatura com grande consenso nacional, depois de a liderança do PSD se definir sobre o tema.

“A ideia é criar um grande consenso nacional sobre essa matéria e estamos a referir-nos neste momento ao próprio PSD”, referiu José Junqueiro em entrevista à Lusa, salientando que entidades como a Associação Nacional de Municípios (ANMP) defendem a regionalização, “mas o PSD está muito dividido”.

“Se ouvirmos o dr. Filipe Menezes ou o dr. Passos Coelho, entendemos que um quer e outro não quer. Como a liderança do PSD não está definida, nós devemos dar tempo ao PSD para se reencontrar na sua direcção e na sua orientação política, para partilhar com todos os partidos e com o PSD esse grande desígnio para o país”, afirmou.

A futura regionalização terá por base cinco regiões-plano, com pormenores concretos ainda não definidos, segundo uma lei-quadro que o Governo já está a trabalhar, “para que em momento oportuno” mostre que tem “o trabalho de casa feito”.

“No fundo, as regiões são grandes autarquias que permitirão uma melhor planificação do território e dão uma garantia mais efectiva ao reforço do papel do poder local no desenvolvimento dos território. Esta ideia das regiões, a predisposição da ANMP em estar articulada com as ideias do PS e do Governo e do Primeiro-Ministro (PM) para alcançar esse grande objectivo é algo que nos dá um horizonte positivo que nos permite pensar a Regionalização como uma realidade ainda nesta legislatura”, considerou.

Segundo o governante, os actuais distritos serão “automaticamente eliminados” pelas futuras regiões, mas os municípios deverão desempenhar um papel semelhante ao de hoje, nas áreas do planeamento e ordenamento do respectivo território, com competências e recursos financeiros para executarem um conjunto de transferências da Administração Central.

Com a regionalização, terá de ser aprovada uma nova lei eleitoral já que os actuais círculos - que correspondem aos distritos - terão de ser extintos.

José Junqueiro espera por isso que sejam criados os já discutidos círculos uninominais e o círculo eleitoral nacional também em paralelo ao processo de regionalização.

O secretário de Estado considerou que “o grande mérito do Governo” foi ao de ao longo da última legislatura ter preparado uma reorganização dos serviços no território de forma a que a própria sociedade considerasse a Regionalização natural.

“Como disse o primeiro-ministro, era preciso preparar o território, fazer o PRACE, o Simplex e desconcentrar um conjunto de serviços, para depois caminharmos para a Regionalização e a instituição em concreto das regiões”, disse, realçando que, hoje, até o planeamento dos equipamentos tem “uma filosofia supramunicipal, já que “o próprio QREN [Quadro de Referência Estratégico Nacional] privilegia equipamentos de uso comum.

“Hoje as pessoas estão preparadas para esta nova realidade”, conclui.

Algarve pela regionalização


«O ALGARVE ESTÁ A PRECISAR DE UM CHOQUE DE ADRENALINA»


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Miguel Freitas, líder do PS Algarve, discursou para quadros do partido num jantar que assinalou o início do ano político de 2010. Foi crítico e reivindicou um maior protagonismo para a região.

«O governo foi mais centralista do que aquilo que nós gostaríamos. Achamos que é necessário aumentar o processo de desconcentração para os serviços desconcentrados do Estado. Não podemos esperar pela regionalização para poder gerir aquilo que são os nossos destinos. Há muito que pode ser feito na região», disse Miguel Freitas, presidente do PS Algarve, no discurso que fez no jantar com quadros socialistas, na passada segunda-feira, em Faro.

Na sua intervenção, Miguel Freitas expressou o desejo de que o Algarve seja colocado no «centro das prioridades do país», considerando que a década que agora se inicia é a «década da educação, da qualificação, da cultura e da informação para todos. A década do retorno ao território, à terra e ao mar, aos rios e às rias.

A década do Algarve como ecoregião».

O líder socialista e deputado, nomeado para coordenar o grupo de trabalho do Desenvolvimento Regional na Assembleia da República, adiantou, na sua intervenção, que esta década será a do «turismo sustentável. A década da imaginação, da inteligência e da alegria.

A década da regionalização. A década da Euroregião do Sudoeste Peninsular», mas, para que tal aconteça, o Algarve tem que se «preparar e agir».

Miguel Freitas reconheceu que «os últimos anos foram anos de esvaziamento dos serviços desconcentrados do Estado, da redução da capacidade de intervenção da Entidade Regional de Turismo, que não pode ser um braço do Turismo de Portugal na região, do esquecimento da agência de desenvolvimento do Algarve (Globalgarve), do esgotamento do projecto da Associação de Municípios. Isto tem que mudar, estas instituições têm que ter uma nova dimensão».

O deputado e líder do PS Algarve foi peremptório a reconhecer o reforço do papel da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional, pois entende que «é preciso haver uma coordenação clara do ponto de vista do investimento público na região».

«Temos que ser rigorosos. Temos que saber escolher e as escolhas fazem-se quando todos sabemos aquilo que se vai fazer. O que vai acontecer, se não houver essa coordenação regional por parte da CCDR, é termos entidades oficiais a fazer investimentos na região que o Algarve não precisa neste momento e outras a não fazer investimentos que são urgentes.

A única forma que temos de ter um investimento rigoroso é fazer uma coordenação a nível do PIDDAC na região e isso deve ser competência da CCDR», disse Miguel Freitas. Em suma, diria, «somos uma região que está seriamente afectada no seu peso institucional e em perda de valor».

Miguel Freitas assumiu mesmo uma postura reivindicativa e considerou ser «preciso acelerar a execução do QREN, do PRODER e do PROMAR. Os atrasos no apoio ao investimento estão num momento em que começam a ser intoleráveis. É preciso avançar».

E, para ele, em 2010 devem avançar o Hospital Central do Algarve, as obras na EN 125, a ampliação do Aeroporto de Faro, o Polis da Ria Formosa e o da Costa Vicentina, a recuperação do património de Sagres, mas tudo isto deve ser feito no «quadro de uma nova agenda regional», que passa, inclusive, por «alterar profundamente o modelo económico».

A concluir, Miguel Freitas afirmou que o «Algarve está a precisar de um choque de adrenalina. Tem de sair do estado de dormência em que se encontra. Tem de construir uma consciência colectiva positiva. Tem de saber que é preciso fazer mais e sempre melhor. E isso depende muito mais de nós do que dos outros. É preciso um Algarve que se assuma. É preciso um Algarve que fale para o país e do país. É preciso um Algarve mais positivo».

Partido Português das Regiões



Partido Português das Regiões
PPR

Defende um modelo democrático assente nos valores regionais, éticos e sociais de liberdade, desenvolvido através de órgãos nacionais, regionais e autárquicos. Inscrito oficialmente no Tribunal Constitucional conforme Acórdão 256/95, publicado no Diário da República II Série de 23/06/1995. O seu registo foi cancelado através do Acórdão 750/98 do Tribunal Constitucional, publicado em Diário da República, II Série, em 23/07/1999. Nunca concorreu a qualquer acto eleitoral.



Organograma
(Fonte: Estatutos aprovados na I Congresso de Julho de 1995)

 

"Partido Português das Regiões"


"O Partido Português das Regiões (PPR) foi um partido político português, já extinto, criado em 1995. Defendia um modelo democrático assente nos valores regionais, éticos e sociais da liberdade, desenvolvida através de órgãos nacionais, regionais e autárquicos.


Adoptaram como símbolo uma estrela prateada sobre outra estrela azul tudo circunscrito por um círculo também azul.

Força partidária de matriz regionalista que apenas pretendia concorrer por um círculo do Porto, preconizava a defesa e promoção, em geral, de "valores regionalistas", com características semelhantes à Forza Italia de Sílvio Berlusconi.

O partido foi liderado por Arlindo Neves, antigo Presidente da Câmara de Gondomar, tendo como "homem sombra", Avelino Ferreira Torres, um ex-militante do CDS que presidia à Câmara de Marco de Canaveses. Outras figuras importantes eram Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do F.C. do Porto, Manuel Vaz, ex-presidente da Câmara da Póvoa do Varzim (pelo CDS e depois pelo PSD) e dirigente desportivo, que iria encabeçar a do PPR no círculo do Porto e José Gomes, antigo presidente do F.C. Paços de Ferreira. Tinha ainda como figuras mediáticas do desporto, os futebolistas Vitor Baía e João Pinto e o ciclista da Sicasal, Paulo Ferreira.

Nunca concorreu a qualquer acto eleitoral.

O seu registo foi cancelado em 1998".



( Origem deste texto: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre )


Desligar a Corrente


O Rio Douro produz mais de metade da electricidade proveniente de recursos hídricos em Portugal.

Com a construção das novas barragens nos afluentes, vai aumentar essa capacidade. É no norte que está situada a central que controla as descargas nas barragens nacionais, evitando assim cheias nos grandes rios do País, como o Tejo, Zêzere, Mondego e Guadiana. Só não as consegue evitar no Douro. É uma força incontrolável.

Com a perspectiva da regionalização no horizonte, devemos começar já o apelo ao voto pela reforma das reformas. E começar a cobrar o uso dos nossos recursos para o bem estar de quem nos leva os impostos para desenvolver um País à parte, onde qualquer mini-tornado se transforma numa causa nacional.

A preocupação dos jornalistas, na última semana, era a escassez de tomate e alface no MARL (Mercado abastecedor da região de Lisboa), como se o Norte dependesse das estufas do Oeste para ter uma saladinha na mesa.


Não, meus senhores!


Eles é que dependem na nossa bondade para terem luz em casa e nas empresas!

E para não terem água pelos joelhos!


Mitos - História (2)




A atribuição ou a confirmação de forais por parte dos soberanoscorrespondeu também ao seu projecto de fazer difundir a autoridade da Coroa e de firmar alianças com estas comunidades de homens livres, de modo a contrabalançar o peso dos poderes senhoriais que se faziam sentir local e regionalmente. Por sua vez, tal aliança colocou os concelhos sob a protecção régia, procurando aqueles defender-se das pressões dos senhores locais. Os habitantes dos concelhos preferiam pagar ao rei os tributos fixados por escrito no foral, quer pela posse da terra, quer pela circulação e transacção de produtos, a estarem sujeitos à arbitrariedade e aos abusos praticados pelos senhores. [Bernardo Vasconcelos e Sousa, (2009). "Idade Média", in Rui Ramos, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro, História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, pp. 73]
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Aqui podemos surpreender não apenas um reforço do que se escreveu aqui ontem sobre a questão da regionalização, mas uma dascaracterísticas essenciais da relação dos portugueses com o poder. Por que razão somos tendencialmente favoráveis ao centralismo? Porque tememos o arbitrário do poder que está próximo.

Os portugueses desconfiam do poder, desconfiam, certamente com razão, da sua arbitrariedade. Ora o poder central é longínquo e tem um carácter abstracto e universal. Ele é preferível aos poderes mais próximos, aparentemente mais fracos, mas com uma maior capacidade de interferir na vida concreta das pessoas.

Isto revela uma outra coisa. A natureza do poder de proximidade em Portugal, ainda hoje, é dada pela capacidade de decisão arbitrária. A ocupação de determinados lugares na estruturas municipais e nas instituições locais dependentes do Estado, como escolas, hospitais, etc., não significa uma representação local de um poder abstracto e universal, que trata todos por igual, mas a possibilidade dos indivíduos e grupos locais exercerem o seu arbítrio. Não é isto, obviamente, que está consignado na lei, mas é isto que é sentido por todos.

O exemplo mais recente é o da contestação, mais ou menos surda (pois o medo está instalado), dos professores relativamente aos directores de escola. Enquanto as escolas eram dirigidas por presidentes de conselhos executivos, a arbitrariedade destes estava limitada, pois não deixavam de ser professores. A solução encontrada pelo governo anterior foi a pior possível para os professores. Não apenas lhes impôs um director, mas um director dependente dos poderes fácticos locais. Seria menos doloroso para os docentes que o director fosse estranho à comunidade local e nomeado pelo poder central. Pelo menos havia, uma aparência de universalidade e abstracção.

O triunfo nas escolas portugueses do arbitrário local tem umaconsequência absolutamente devastadora para o futuro do país. As escolas, já com fraca capacidade de debate interno, são hoje em dia túmulos relativamente ao debate pedagógico e educativo. Desapareceram as condições para a divergência e para pensar contra, e para fazer de outra maneira, a não ser aquela que os poderes instalados conseguem idealizar e realizar.

Uma segunda consequência, de não menor impacto no futuro, é a que deriva destes poderes existentes nas escolas, a chamada gestão intermédia ser entregues a pessoas com um pensamento extraordinariamente frágil sobre a educação e o sistema educativo, mas que, pelo princípio de autoridade, fazem calar os elementos esclarecidos, claramente minoritários, que possam existir, e que teriam capacidade crítica. As escolas ficaram sujeitas ao menos denominador comum.

A referência à escola é apenas exemplar, pois é a instituição que melhor conhecemos. Isto passar-se-á nas outras instituições. A proximidade do poder, desde a origem da nacionalidade, é sentida não como a presença do universal abstracto, mas do arbitrário concreto. Há uma profunda linha de continuidade na nossa tradição, embora na Idade Média o que estava em causa fosse a liberdade das comunidades locais perante os senhores e, hoje em dia, seja a dos indivíduos perante os poderes locais ancorados em outros indivíduos.

Em Portugal, não há um amor ao anarquismo, mas fundamentalmente um medo da arbitrariedade do outro, quando esse outro é investido por qualquer tipo de poder. Isto revela uma longa tradição de uma determinada forma de exercício de poder.

Mitos - História (1)





A instabilidade militar e social do reino, bem como o clima de conflitos a que não escapou o próprio Sancho I (em fricção com os bispos do Porto e de Coimbra e com sectores da nobreza), prolongaram-se até ao final da vida do monarca. De um modo geral, o rei colocou-se ao lado dos concelhos nas querelas contra os poderes senhoriais exercidos por alguns prelados, como sucedeu entre o burgo do Porto e o seu bispo em 1208. Face aos poderes concorrentes detidos pelos senhores laicos e eclesiásticos, o monarca privilegiava a aliança com as principais comunidades urbanas, elas próprias também interessadas numa regulada ligação à Coroa que as defendesse do que consideravam ser a arbitrariedade senhorial. [Bernardo Vasconcelos e Sousa, (2009). "Idade Média", in Rui Ramos, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro, História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, pp. 46/7]
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Não é transferível a situação política de Portugal medieval, com o reino ainda em fase de consolidação, para os nossos dias. Há, no entanto, elementos persistentes na estruturação política do país que devem ser pensados na sua espessura histórica. Hoje em dia, quando o governo e o partido que o apoia querem retornar à questão daregionalização, não é inútil, apesar da diferença epocal, social ecivilizacional, perceber a estrutura fundacional da nacionalidade.

Se olharmos para o texto citado, encontramos três realidades políticas coexistentes. O poder real, de carácter central, o poder senhorial, laico e eclesiástico, que poderíamos dizer de carácter regional, e o poder concelhio de carácter municipal. O que acontecia é que a estrutura senhorial, de naturezar intermédia, constituía um factor de perturbação tanto do poder central (pois os senhoresaspiravam vincar a sua paridade com o rei, que não seria mais do que o primeiro entre pares) como do poder concelhio (a quem aspiravam submeter à sua arbitrariedade).

Aqui está um dos principais problemas que se levanta contra aregionalização. Problema, aliás, claramente sublinhado pela história recente das regiões autónomas. As regiões que se preparam são, em princípio, uma espécie de sobre-município, de uma autarquia local de carácter regional. O problema é que isso é apenas o começo. À volta dessas super-autarquias criar-se-ão elites políticas que quererão aprofundar o carácter regional da autarquia, inventar uma cultura regional, aspirar a uma maior distribuição do poder. Haverá todas as oportunidades para que essas elites regionais se venham a comportar, tanto para com o poder central como para com o municipal, da mesma forma que o poder senhorial medieval se comportava perante o Rei e os concelhos.

Este é um problema que merece ser pensado. O que está em jogo não é apenas o enfraquecimento do poder central, e o que isso significa para os mais fracos, mas também o próprio poder municipal. O país mudou, a sociedade é radicalmente diferente, mas a espécie humana e a natureza das elites portuguesas mantiveram-se idênticas.